domingo, 3 de março de 2013

Renúncia papal deveria ser atitude normal


03/03/2013 12h11 - Atualizado em 03/03/2013 12h21

Renúncia papal deveria ser atitude normal, diz padre brasileiro em Roma

José Ulisses da Silva é secretário-geral da congregação dos redentoristas.
Para ele, Papas deveriam poder se afastar quando esforço ficar desumano.

Por:Juliana CardilliDo G1, em Roma

Assim como boa parte da Igreja Católica, a Congregação dos Redentoristas, que fica no Centro de Roma, viu a decisão do agora Papa Emérito Bento XVI de renunciar ao comando da Igreja Católica como um ato de coragem e amor à Igreja. Mas o secretário-geral da congregação, o padre brasileiro José Ulisses da Silva, de 69 anos, vai além – para ele, o gesto de Bento XVI deveria se tornar uma atitude comum na Igreja Católica, evitando que pessoas já sem condições físicas sejam expostas à grande demanda exigida de um Papa.

Padre Ulisses, como é conhecido, está em Roma desde fevereiro de 2012, e ocupa o cargo de secretário-geral da Congregação do Santíssimo Redentor – mais conhecida como dos redentoristas, grupo que reúne 5,5 mil missionários em todo o mundo. Neste domingo (3) ele falou com o G1 sobre o impacto da decisão na Igreja, e como vê o andamento dos próximos passos, nos quais será eleito o novo pontífice.
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"Para nós, redentoristas, o impacto da renúncia foi positivo – uma visão de admiração, coragem de tomar essa atitude. É desumano exigir de um idoso levar em frente a coordenação de uma Igreja internacional, com uma agenda tão demandante”, afirmou. “Me parece que ele tentou desmistificar a figura do Papa. O desejo que temos é que esse gesto se torne uma atitude normal. Vimos o sofrimento do Papa Paulo VI, do Papa João Paulo II. Não se pode exigir isso. Eu não exigiria esse esforço do meu pai, do meu avô – por que temos que exigir do Papa?”

Padre Ulisses relembra que a idade nem sempre é um agravante, e sim as condições de saúde da pessoa. “O corpo não aguenta o ritmo. São diversas audiências, é preciso decidir diversos casos, os 'abacaxis' que ele tem que resolver, enfrentar as tendências, as problemáticas internas do Estado do Vaticano, uma série de desafios. Agora talvez até tenha tido uma questão de abuso de poder, mas ainda não ficou muito claro.”
O padre Ulisses (Foto: Juliana Cardilli/G1)

Ele sugere um procedimento semelhante ao que ocorre com os bispos – todos devem apresentar sua renúncia aos 75 anos. Algumas vezes, ela não é aceita, mas na maioria delas, é. O limite de idade para os Papas poderia ser mais elástico, mas seria uma demonstração de humanidade. “Era interessante que houvesse alguma forma de discernimento, que não apenas do próprio Papa, que foi o caso de Bento XVI, em que ele pudesse ser convidado a renunciar e que fosse algo normal”, afirmou o padre.

Futuro da Igreja
Com o início das congregações que precedem o conclave marcado para esta segunda-feira (4), cresce a expectativa entre os religiosos em Roma sobre as possíveis mudanças na Igreja. O nome do cardeal brasileiro Dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, tem crescido entre os possíveis papáveis – o jornal italiano “La Stampa” publicou neste sábado (2) uma reportagem que indicava articulações do cardeal decano, o italiano Angelo Sodano, para eleger o brasileiro e colocar um italiano ou um argentino de origem italiana como secretário de Estado. O "Il Messaggero" também coloca Scherer numa lista de quatro "favoritos".

O secretário-geral dos redentoristas vê como possibilidades os cardeais italianos Angelo Scola e Gianfranco Ravasi, além do próprio Dom Odilo – “já trabalhou em Roma, assumiu uma arquidiocese grande, é intelectualmente preparado” – e o cardeal hondurenho, Óscar Andrés Rodríguez Maradiaga. “Ele é uma presença forte. Não se omite em diversas questões, nem mesmo nas questões políticas de seu país.”

Acima de tudo, padre Ulisses espera que o próximo Papa seja alguém com experiência pastoral, capaz de mudar alguma coisa na estrutura da Igreja.

“Para mim, a grande esperança é uma reestruturação total da Cúria Romana, que as conferências episcopais assumissem um papel mais decisivo, a própria assessoria do Papa não fosse uma assessoria em que as pessoas se eternizam em um mesmo papel, e acabam se eternizando também no tipo de poder, e eventualmente até de manipulação de certas coisas”, afirmou.

Padre Ulisses também espera que os bispos – que estão mais próximos das comunidades e pastorais, pudessem ter uma voz ativa mais respeitada na Igreja. “É o sonho de um tipo de poder colegial, em que o Papa continua sendo o primeiro de todos, aquele que dá o aval a tudo, mas os demais também tem uma responsabilidade pastoral e uma voz forte para ajudar no governo da Igreja.”

Por isso, ele deseja que o eleito não seja alguém que já trabalhe na Cúria, nem alguém com raízes reacionárias ou demasiadamente conservadoras. “Tomara que seja um Papa que não tenha medo de abrir as portas e janelas da Igreja, para entrar um ar novo. Estamos em um momento em que isso é preciso.”

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